sábado, 27 de agosto de 2011

Uma Abordagem em Torno da Especialização Precoce


 Uma Abordagem em Torno da Especialização Precoce
 Bompa (2002) esclarece que a especialização precoce se constitui numa prática sistemática de um único tipo de esporte antes da puberdade, esporte este predominantemente competitivo, exigindo elevada dedicação aos treinamentos e com objetivo de se alcançar resultados (títulos) em curto espaço de tempo.
Também, Santana (2001, 2004) conceitua treinamento intensivo precoce (especialização precoce) o período onde a criança é submetida a programas e métodos especializados a sobrecargas da qual não está amadurecida para suportar. É quando a criança faz sistematicamente um único tipo de esporte e quando a literatura especializada diz ser o momento da diversificação. O mesmo autor (1996) coloca de modo bastante apropriado, que isto acontece especialmente no futsal e que lhe resulta críticas de diversos estudiosos do desenvolvimento e da pedagogia esportiva. Pois, tornou-se comum neste esporte a inclusão de crianças em competições federadas, disputando regularmente competições com nível de exigência acima do suportado por esses “pequenos praticantes” culminando na especialização precoce tanto do ponto de vista técnico, como tático.
Muitas vezes essas competições conservam regulamentos similares ou até mesmo idênticos aos utilizados nas categorias maiores o que tem gerado devido ao despreparo de pais, dirigentes e professores uma situação diferente da buscada no esporte infantil: o clima hostil, de muita rivalidade que muitas vezes provocam atritos entre equipes adversárias. (COELHO, 2000). 
Sabe-se que numa escala acentuada a iniciação esportiva não tem obedecido algumas diretrizes pedagógicas e que estão postas em diversos teóricos do campo esportivo, para quem deseje delas se apropriarem considerando que o rendimento em crianças deve ser relativizado, tendo como prioridade a aprendizagem e não os resultados, que o esporte na infância deve se constituir num agente facilitador educacional sendo utilizado interdisciplinarmente. Algo nesta direção é discutido por Paes (2002) quando propõe evitar a prática regular de apenas uma modalidade esportiva antes dos 10 anos de idade.
Ora não obstante os abusos cometidos, ensino de uma modalidade esportiva deve acima de tudo adequar suas ações para aqueles que nela buscam iniciar por este universo. A prática docente tem um papel primordial neste contexto e a depender da sua direção, muito dos garotos envolvidos com o esporte poderão prolongar sua vida esportiva sem correr o risco de saturarem cedo emocionalmente ou em outros aspectos e abandonar o esporte.
Algo deste particular é colocado por Santana (2001) ao afirmar que se a pedagogia conduzir os educandos a se especializar na execução de gestos técnicos, em jogar em apenas uma posição, a dedicar-se mais de três sessões semanais de treinamento, a se sentir reserva ou titular (e com isso participar mais ou menos dos jogos), a prescindir do lúdico (parar de brincar por ter que treinar e jogar), a competir formalmente, isto repercutirá negativamente em algum momento na vida dos aprendizados. É preciso, portanto, levar em conta a idade dos iniciantes, pois senão, corremos os riscos de está desenvolvendo trabalhos inadequados e de caráter precoce e para essas crianças envoltas no egocentrismo próprio dessa fase e presas aos objetivos individuais, não é simples entender os objetivos propostos para elas por pais e professores e com isso tendendo a desmotivar-se a abandonar o esporte.
Não recriminamos assim como Santana faz sentido in a iniciação ao esporte, desde que as aulas contemplem além das vivências esportivas, outros aspectos caros neste momento como: habilidades básicas, atividades diversificadas que possibilite o enriquecimento do acervo motor. Assim, é imprescindível a participação de todas as crianças envolvidas neste ambiente independentemente do nível de desenvolvimento, de modo a favorecer um alargamento das interações sociais, culturais, morais, educacionais e cooperativas, opondo-se as limitações que se dá dentre outras formas pela especialização de posições e funções no jogo, culpando os mesmos por erros, ou até “punindo” aqueles com menor aptidão com a não participação de jogos.
Partes das afirmações acima corroboram com os argumentos amplamente embasados na literatura de que as crianças apenas deveriam aprender mais sobre algo específico, (no caso nos reportamos à especificidade do treino) após conviver com a diversidade (PAES, 2002).
Em alguns casos, realizando o oposto do esperado, ao tratar pedagogicamente o esporte infantil, muitos dos professores que trabalham nas categorias de iniciação utilizam costumeiramente uma pedagogia pautada no rendimento esportivo, logo uma pedagogia menos preocupada com educação em sua complexidade e mais com a descoberta de talentos promissores, ferindo assim algo buscado pelos “pequenos” quando se voltam para o esporte na iniciação. Quase sempre, valores como cooperação, alegria e liberdade entre outros passam a ser colocados em segundo plano onde deveriam ser princípios norteadores da pedagogia do esporte infantil. Ao desvincular a iniciação esportiva de uma finalidade educacional, a pedagogia dos professores que trabalham com esporte na infância, apresenta diversas lacunas. É por tal condição que Santana (2004), aponta o quanto os especialistas deveriam reconhecer a conexão existente entre esporte na infância, educação e complexidade. Só para refletirmos a importância do assunto em questão, De Rose Jr (2002) cita que o início de competições pode variar de acordo com a modalidade, tendo registros de crianças participando de competições de ginástica e natação a partir dos 3 anos de idade.
Com relação a este fato, Santana (2001) diz haver vários indícios de que muitas são as crianças que iniciaram precocemente na vida esportiva e por lesões, estresse de competição, treinamento, desinteresse, saturação, entre outros abandonaram o desporto escolhido ainda muito novo. E tal quadro por si só, já caberia uma reflexão pelos profissionais da área acerca da metodologia adotada, a questão é que muitos depois de formados ou mesmo ao longo do curso lêem muito pouco, o que reflete na prática pedagógica e na postura.  Isto deduzimos a partir de nossa experiência enquanto aluno do curso que concluímos recentemente em 2010 e também como profissional que atua na área..
Alguns autores como Voser (1999) e Santana (2001) revelam prevalecer neste ambiente da iniciação, uma carga de treinos excessivos e que tendem a uma saturação dos alunos e no momento que a submissão das crianças aos seus pais vai diminuindo, elas acabam largando a prática do esporte. Essa criança tende a não praticar mais esporte, a não inseri-lo na sua cultura e caso tivesse talento para ser desenvolvido, não iriam adiante encerrando a vida esportiva cedo, não desfrutando do esporte de rendimento.
Esta parece ser uma questão que na atualidade, se verifica em grande escala no cenário esportivo, principalmente pelo fato de imperar uma lógica de formação que apenas importa revelar talentos esportivos e que caberia um estudo local de maior fôlego, por exemplo, verificar o que prevalece na prática do esporte escolar das crianças da rede pública e privada de Recife.
Pois, para Korsakas (2002) uma prática com fins educativos não pode pautar-se na seleção de talentos e na especialização dos talentosos deixando os menos talentosos a margem do processo, sendo assim excludente por essência escolhendo poucos para terem direito aos seus benefícios.
Sobre este mesmo assunto Santana (2001) cita que alguns princípios e procedimentos devem ser construídos para ensinar o esporte na infância que sejam antagônicos a outros, voltados apenas para especialização, a seleção, a revelação de talentos e conquistas esportivas.  Essa nova maneira de ensinar esporte deve ser um facilitador às crianças na construção de sua autonomia, dentro dessa perspectiva o esporte é um facilitador para atingir os fins descritos anteriormente. E na sua concepção crianças não devem ser obrigadas a aprender muito sobre determinado assunto, devendo sim ser incentivadas a aprender sobre vários assuntos é a idéia da ampliação da base motora (SANTANA, 2004.).
Ora ao levarmos em conta que a especialização precoce tem suas implicações e conseqüências, entre as tais os danos a que são expostos, apresentamos em linhas gerais aspectos negativos ligados a este fenômeno esportivo, disposto assim da seguinte forma e com base principalmente no que sugere Santana (2001) e outros:

v  Danos causados a criança
Competições regulares, aprimoramento de gestos técnicos, assim como conhecimento tático e as capacidades físicas direcionadas para o rendimento esportivo que também é uma forma de especialização precoce, nesse tipo de treinamento, a criança sofre pressões para comportar-se como alguém que não é refletindo uma situação inútil que leva os professores a tomarem o tempo dos outros de serem crianças.
Mutti (2003) neste sentido acredita que quando temos o treinamento voltado para busca de resultados imediatos a iniciação esportiva adequada fica cada vez menos em foco. O problema fica acentuado quando vemos cada vez mais adeptos a essa pedagogia devido ao status de vencedor ao quais os treinadores que terão melhores resultados em curto prazo que lhes conferem certa visibilidade no ambiente esportivo. No entanto, a verdadeira face da competição é a produção de mais perdedores que vencedores, esse grande número de derrotados esportivamente podem se desencorajar aqueles que não possuem capacidade e habilidade suficiente para obter o resultado esportivo esperado e desejado. (DE ROSE JR, 2002)
v  Riscos de uma pedagogia que opta por especializar a criança cedo
Aqui são apontados alguns dentre muitos: (SANTANA, 2004)

·         Estresse de competição - caracterizado pelo sentimento de medo e insegurança com causa principal por conflitos de uma prática excessivamente competitiva. O medo de errar faz a criança ter medo de executar a ação e ter sua auto-estima ameaçada.
·         Saturação esportiva - a criança manifesta desânimo e desinteresse em praticar a atividade. Uma situação que decorre em virtude de quem praticou o esporte em excesso e não quer mais praticá-lo
·         Lesões - causadas pelo piso duro dos esportes de quadra, pelos buracos em esportes de campo, pelo esforço repetitivo, entre outras causas. Praticado em excesso, inadequadamente podendo ocasionar lesões epifisárias, fraturas e déficit de crescimento.
·         Formação escolar deficiente - entrega demasiada da criança aos treinamentos especializados, tendo jogo aos fins de semana não deixando tempo livre para a criança estudar. Isto segundo Santos (2010) tem resultado negativo principalmente para as crianças que não tem outra garantia que não seja aquela que a educação pode oportunizar.
·         Unilateralização de desenvolvimento - tem a ver com a especialização técnica de determinadas habilidades específicas em ­­­­detrimento ao desenvolvimento global, plural onde a diversificação dos movimentos e gestos técnicos são privilegiados.
·         Reduzida participação em jogos e brincadeiras infantis -  o método parcial de ensino furta o lúdico, a criança fica longe dos jogos e brincadeiras fazendo a criança prescindir do simbolismo, do faz de conta, elementos imprescindíveis para a capacidade de desenvolvimento da criatividade e improvisação.

v  Conseqüências da atividade física intensa em crianças na fase escolar inicial.
A atividade física em crianças em fase escolar inicial deve ter especial atenção do professor de educação física devido a conseqüências que essas atividades físicas podem ocasionar nos educandos em questão.
Segundo Pini apud Abreu et al. (2005) a atividade esportiva deve ser criteriosamente orientada para agir positivamente para o crescimento e desenvolvimento morfofuncional do organismo das crianças envolvidas é preciso levar em conta as fases de desenvolvimento motor, para saber o que é próprio de cada fase. A alta intensidade do trabalho muscular, associada a sobrecarga funcional, pode acarretar em perturbações no desenvolvimento normal da criança, especialmente no ritmo de crescimento e altura além de também influenciar no desenvolvimento somático, funcional e intelectual.
Para Ctenas e Vitolo apud Abreu et al. (2005) o corpo da criança passa por rápido desenvolvimento, principalmente nas extremidades corporais não estando a criança preparada para realização de esforços exagerados.
Rose apud Abreu et al (2006). Diz que exercícios excessivamente realizados podem causar estresse, desviar energia destinada ao crescimento das crianças e ainda provocar lesões, prejudicando a saúde da criança. Adequar à intensidade é uma obrigação do professor. A supressão do eixo GH-IGF-1 (especifica o que é pois nem todo mundo sabe coloca em parêntesis) é outro fator fisiológico que inibe o crescimento da criança.
Do exposto até aqui, suscita para nós uma questão que consideramos importante, qual seja, a de que o ensino do esporte precisa ser melhor debatido e aprofundado por aqueles atuam como profissionais da formação. É necessário que nos debrucemos em torno de uma reflexão sobre a “práxis” pedagógica no campo esportivo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário